quinta-feira, junho 03, 2004

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Errar pode ser desumano

O que menos me satisfaz na minha actividade profissional é o facto de ter de avaliar pessoas. Diria mesmo que a avaliação de conhecimentos é o que mais detesto na minha profissão. Não tenho, contudo, alternativa. Sou obrigado a correr o risco, milhares de vezes, de me enganar e cometer um erro de avaliação, cometendo potencialmente injustiças. Mas estes meus erros e injustiças virtuais, tenho disso consciência, podem sempre ser corrigidos, pelo recurso a exame por parte do aluno, ao qual atribuí, por exemplo, um oito, quando na verdade era merecedor de um dez. Embora sendo improvável, posso voltar a errar em relação ao mesmo aluno. Mas ele pode sempre voltar a fazer exame, em segunda época. Pode, inclusive, repetir a frequência da disciplina, no ano seguinte. Mesmo supondo, hipótese absurda, que esse aluno nunca conseguirá aprovação na minha cadeira, concluirá o curso sem ter, no seu curriculum escolar, a aprovação na minha disciplina, tratando-se de uma das disciplinas optativas que lecciono. Mantendo a hipótese absurda, caso se trate de uma disciplina obrigatória (do tronco comum) que também lecciono, o aluno poderia nunca conseguir concluir o seu curso. Seria penoso e lamentável para a vida profissional e realização pessoal desse aluno, mas nunca irremediável para a sua existência como pessoa e como cidadão. Inversamente, um erro médico no bloco operatório pode ser irreversível para a integridade física de um paciente. Um erro judicial pode ser, dramaticamente, irremediável para a integridade moral de um indivíduo, como ser humano e como cidadão. Errar, nestes casos, pode ser desumano.

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