quinta-feira, abril 15, 2004

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Excelência a metro

Um dos temas de que nos ocuparemos, também, neste Forum, será o ensino superior e a investigação científica, onde aliás, certamente, contaremos com o conhecimento aprofundado do tema por parte de alguns colegas que marcam presença na blogosfera, como é o caso do Professorices, do Causa Nossa e do Holocénico, onde fui alertado para a notícia comentada pelo Empatia e que também captou a atenção do colega Rui Tavares, do sempre atento Barnabé.

A ministra da Ciência e do Ensino Superior, anuncia uma nova medida para premiar a excelência e atrair "os cérebros" nacionais, actualmente a residir em países onde a carreira científica é mais atractiva. O Estado (leia-se a Fundação para a Ciência e Tecnologia, que - já agora - congelou financiamentos à investigação de compromissos assumidos anteriormente, paralisando a investigação científica em diversas áreas, no país) pagará despesas de investigação aos jovens doutorados que possuam, pelo menos, 100 artigos científicos publicados em revistas internacionais e tenham já orientado, no mínimo, 10 teses de doutoramento. No caso dos que residam no estrangeiro, e queiram regressar, o valor pecuniário financiado duplica.

Como dizia há dias e antes desta medida ser anunciada, um colega com humor, "passaremos a funcionar segundo os valores em Bolsa, comandados pelos critérios de NASDAQ". Há uma corrida desenfreada pelo maior número de publicações em revistas científicas internacionais. O critério é o número. Animado de tal espírito, outro colega, anunciava-me há tempos já ter cerca de sessenta publicações (quase todas nacionais entenda-se), no seu curriculum. Ao que retorqui, assinalando o meu espanto, que tanta publicação já devia dar uns bons metros de curriculum.

Quanto à medida em apreço: mesmo sabendo que se está a falar de revistas com referees, parece-me difícil conseguir excelência de uma tal quantidade de artigos por parte de um jovem cientista. Embora mais verosímil, o critério das 10 tutorias de doutoramento, parece-me, igualmente, de difícil alcance por parte de um jovem investigador.

Sabendo que a actual ministra provém da carreira académica e científica, certamente que terá as suas unidades de medida para propôr tais metas. Mas, conhecendo nós, o esforço e tempo necessários para a produção de um artigo científico com a qualidade exigível para publicação; mesmo os mais dedicados e frenéticos jovens investigadores terão, certamente, dificuldade em atingir tal desiderato. A não ser que, não haja, de facto, o mínimo de trabalho de pesquisa, como é hábito entre nós, por parte do ministério, para saber o número de potenciais abrangidos por esta medida. E, assim sendo, avançam-se critérios de exigência tal que não se corre o risco de eventual falta de verba orçamentada para o efeito. Já que, como sabemos, as restrições orçamentais são, para este governo, imperativo categórico da sua política, de todas as medidas e da falta delas...

Nota: Só hoje (15-04-04) vi que o Professorices já havia escrito, também, sobre a questão, no momento em que redigi este post. Aqui fica a nota.

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