Escreveu, em tempos, Boaventura Sousa Santos que em Portugal, na ausência, ou debilidade, de um Estado-Providência, o seu equivalente funcional foi, e é, uma Sociedade-Providência. Julgo ser factualmente verdadeira essa tese. Essa "virtualidade" da sociedade portuguesa para se substituir ao Estado, na sua função de regulador social, não me parece ser, contudo, merecedora de regozijo. Bem pelo contrário. Trata-se de um factor do atraso e do atavismo nacionais. Ela denuncia a presença forte na nossa matriz cultural do "familismo" e do "amiguismo", operantes não apenas na providência face à pobreza e aos desfortúnios da vida, mas genericamente, na providência face a processos de ascenção profissional e social, gestão de carreiras e de trajectos de vida, compadrios, clientelismos e caciquismos. Um conjunto de factores socialmente tipificantes em que a sociedade portuguesa mais se afasta de regiões da europa onde o Estado Providência se institucionalizou e ganhou foros de estrutura fundamental de organização política das respectivas sociedades, sociedades efectivamente modernas. Inversamente, é através daquelas caracteristicas de "sociedade-providência" que mais nos aproximamos daquelas regiões da Itália em que a Camorra e a Máfia têm um peso determinante nas respectivas estruturas sociais.
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