quinta-feira, março 10, 2005

_________________________________________________________________

QUADRATURA DO CÍRCULO

A divisão da perspectiva sobre política externa entre atlantistas e não atlantistas fará cada vez menos sentido num contexto pós-guerra fria e de crescente globalização. Menos sentido ainda faz num contexto em que a geo-estratégia mundial é dominada por uma posição hegemónica dos EUA. Por outro lado, uma coisa é a retórica anti-bush e outra é a perspectiva face aos EUA. Não vejo por que razão uma clara oposição a uma política americana versão Bush possa ser confundida com qualquer perspectiva de menosprezo pelos compromissos de Portugal no quadro da aliança com os EUA. Lembro a posição firme de países como a França e a Alemanha no tocante à aventura de Bush no Iraque, e a distinção que esses países fizeram entre isso mesmo e a sua relação com os EUA. Considero, igualmente, que no actual quadro geo-estratégico global só uma posição firme da UE, e a concertação de uma estratégia desta face aos EUA, mas também face ao Japão e à China, permitirá atingir um equilíbrio razoável de poderes no quadro internacional. A questão está, precisamente, em contrariar a ideia de subjugação obrigatória da generalidade dos países da UE à estratégia americana e, mais ainda, a refutação da ideia de que só é aceitável que esses países tenham uma política externa dependente, não só dos EUA como potência mundial, como de uma determinada orientação política dessa potência. Que princípio político justifica que a escolha do MNE se circunscreva às personalidades seguidoras de um atlantismo baseado nos princípios da guerra fria, e seguidistas face à estratégia pessoal da presidência norte-americana de uma dada conjuntura política? Não vejo, pois, razões para questionar a escolha de Freitas do Amaral para Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, nem vejo nisso qualquer contradição com a perspectiva de Sócrates, a orientação de política externa do PS, ou o seu programa eleitoral. O problema deste tipo de asserções, como a que se tem ouvido em relação a Freitas, é que fazendo a crítica de posições radicais, incompreensíveis nos tempos actuais, pós guerra fria, como as que continuam a ser defendidas pelos partidos mais à esquerda no espectro político nacional - continuam a laborar, elas próprias, com os instrumentos conceptuais e os argumentos próprios dos tempos da guerra fria.

Sem comentários: