domingo, agosto 22, 2004

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Ainda a questão da qualidade dos estudantes universitários

Ao contrário do que alguns arautos da verdade absoluta julgam, não critica quem quer mas sim quem pode. O ensino superior é um exemplo em voga, nos últimos tempos. É necessário saber-se do que se fala, em primeiro lugar, isto é, ter informação credível para o efeito e, em segundo lugar, ter autoridade para apontar o dedo. Tem, por isso, inteira razão o klépsidra neste post que vale bem a pena ser lido.
Com efeito, o tipo de "bocas" do leitor do Abrupto, mais não são do que isso mesmo: "bocas". Sem qualquer fundamentação científica. O problema existe, embora com tonalidades e origens diversas daquelas que o senso comum, incluindo o dos media e dos "cientistas ligeiros", o pintam. Deveríamos começar por interrogar a política de proliferação de Universidades privadas, desencadeada pelos governos de Cavaco Silva, e o seu contributo para o abaixamento da qualidade do ensino superior em Portugal. Por outro lado, o nível de qualidade e o tipo de expectativas de uma parte crescente dos estudantes universitários, não podem ser desenquadrados do crescendo de uma cultura ambiente no país, em que a obtenção de um diploma passou a ser veiculada, nomeadamente pelo marketing de um ensino superior mercadorizado, como um passaporte imediato para aceder a determinados estilos de vida. Trata-se, no entanto, de publicidade enganosa que apenas serve alguns interesses, particularmente aqueles que estão muito bem representados na política de crescimento do ensino superior privado em Portugal. O que está em questão não é um antagonismo à livre iniciativa, também no sector do ensino superior, mas antes os níveis de exigência para o licenciamento dessas instituições privadas, após o início da década de noventa. Desde logo, como bem refere o klépsidra, uma Universidade não é apenas uma instituição de ensino e, como tal, importaria saber que investigação é produzida nessas universidades. Acresce que o desenvolvimento da qualidade do ensino superior, e da qualidade das Universidades enquanto tal, não independe do seu financiamento. Por parte do Estado, no caso das universidades públicas, e por parte das empresas, no caso tanto das públicas como das privadas. O desinvestimento estatal no ensino superior e na investigação científica, nomeadamente nos governos do PSD, tem sido aquilo que se sabe. Quanto ao deserto do investimento privado, nem valerá a pena falar. O nosso tecido empresarial é a miséria que se sabe em vitalidade, preparação técnica e modelos de gestão. Constituído maioritariamente por empresas de muito pequena dimensão, uma parte delas na lógica familiar, na sua maioria sem uma cultura empresarial moderna e, portanto, mais orientadas por uma lógica de lucros imediatos e fáceis, procurando a melhor forma de escapar à sua responsabilidade social, do que para a sua sustentabilidade, por via dessa responsabilidade social e da aposta na inovação que implica, necessariamente, uma articulação com a investigação científica e tecnológica que se faz nas universidades. Ora, se a visão e estratégia política que temos tido nesta matéria, tem conduzido quase sempre a uma postura do Estado que é o que se conhece e se, por outro lado, o nosso tecido empresarial é aquilo que é, porque apontamos o dedo do facilitismo à Universidade e aos seus professores e estudantes, ao invés de irmos aos alicerces do problema? Em ambos os casos onde está a aposta na qualidade, no contrariar o facilitismo, no imprimir à sociedade portuguesa uma dinâmica de desenvolvimento, como se observa em países com os quais gostamos de comparar a qualidade das nossas universidades e do nosso ensino? Então, porque atacamos o ensino superior, os seus professores e os seus estudantes, acusando-os de facilitismo, sem olharmos primeiro para os factores que poderiam estruturar de outro modo, não só as universidades e o ensino nelas ministrado, como a economia e a sociedade em que essas universidades se inserem?

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