segunda-feira, novembro 15, 2004

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Algumas questões epistemológicas

1. Diz o Pedro Mexia, numa nota de humor para os seus amigos sociólogos, que acredita pouco na sociologia como "ciência". Pois fique sabendo Pedro Mexia que eu, como sociólogo, também acredito pouco...
na "ciência" como Ciência. É justamente por isso que acredito na sociologia.

2. Para conhecer cientificamente um problema devemos distanciar-nos dele ou antes nele mergulhar? Ambas as posturas são legítimas e em ambas é possível produzir conhecimento científico. A questão é de natureza epistemológica e quer isto dizer que a Ciência, enquanto tal, não existe. Porque há pelo menos duas posturas epistemológicas no conhecimento científico e a cada uma delas correspondem metodologias diferentes e uma noção do que é a ciência, igualmente diferente.

3. A Ciência é apenas o procedimento científico que adopta o método dedutivo? ou, mais restritamente ainda, em exclusivo o método experimental? E se é assim isso significa neutralidade e objectividade absolutas? E quem é que pode garantir isso? Quem legitima que assim é? E quem legitima que assim é está desinserido de um contexto social, cultural, económico, político e histórico preciso? Ou, inversamente, toda a legitimação do saber e o próprio conhecimento científico estão, necessariamente, contaminados ou condicionados pelo contexto social, cultural, económico e político em que o conhecimento é construído, produzido e depois legitimado como científico? Sendo assim, será o conhecimento científico, inclusive no caso das chamadas ciências "puras", "duras", "exactas" (e outras coisas mais com muitas aspas) imune a tudo isso e absolutamente neutral e objectivo? Julgo que não. É por tudo isso que também eu não acredito...na "ciência" como Ciência.

ADENDA: Se eu acreditasse naquela "ciência" pura, dura, exacta, contar-me-ía entre os que acreditam em coisas como "Coeficientes de Inteligência" (vulgo QI) e nas respectivas estatísticas nacionais ou regionais. Se assim fosse teria de utilizar os dados relativos à média do QI de cada estado norte-americano para considerar cientificamente provada a tese que sustenta que os eleitores americanos que persistiram em votar em Bush são, em média, pouco dotados no que ao QI diz respeito. É que, segundo esses dados "científicos" a maioria dos Estados com o valor médio mais baixo de QI deu a vitória a Bush, enquanto na maioria dos Estados com valor médio mais elevado de QI a vitória foi para Kerry. Justamente no sentido do que foi a acusação que os nossos blogoanalistas apoiantes de Bush fizeram à esquerda blogosférica. Os blogobushistas acusaram a esquerda de chamar estúpidos aos eleitores americanos que persistiram em votar Bush. Pois bem, "a evidência empírica" - como diriam os pró ciência pura que desconfiam da natureza científica da sociologia -, parece dar razão à tese que, supostamente, os anti-Bush terão sustentado recentemente. No entanto, julgo que aquela "ciência pura" e as respectivas "evidências empíricas" devem ser questionadas. Não creio que seja possível inferir, em absoluto, estupidez, da generalidade (estatística) dos apoios eleitorais de Bush.

(Amanhã publicarei a tabela onde tal "evidência empírica" fica demonstrada "cientificamente")

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